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Quer saber mais sobre a biologia das araras-azuis e quais são as principais ameaças à espécie? Clique aqui e confira.

Neste texto, complementamos nosso conteúdo com um assunto tão querido e importante: vamos contar sobre o universo amoroso desses psitacídeos. Entenda como eles escolhem seus ninhos, criam seus filhotes e quais são os fatores que afetam a sua reprodução!

 

Casal de Arara-Azul / Foto: Octavio Campos Salles.

 

A chegada da época reprodutiva

A reprodução dessas aves varia com as condições climático-ambientais. No Pantanal, em anos de cheia, foi observado que a temporada reprodutiva teve início em Julho e os filhotes, em sua maioria, já voavam em Dezembro. Já nos anos mais secos, ela começou mais tarde, por volta de Setembro, com voos em Março.

Fato é que normalmente até Julho as araras-azuis são vistas em bando, quando começam a se separar por casais e se direcionar para os locais de nidificação. Esses casais são formados quando elas ainda são novas, após atingir a maturidade sexual entre os 7 e 9 anos de idade. 

E, sim! Uma vez unidos, eles tendem à manter uma relação de fidelidade por toda a vida, sendo, no geral, exemplos de monogamia, cooperação e união no reino animal

 

Foto: Gustavo Figueirôa.

 

Escolha do ninho 

Essas araras são bastante seletivas na escolha do local onde irão nidificar, optando principalmente por cavidades em árvores de manduvi (Sterculia etriata). No Pantanal da Nhecolândia (MS), 94% dos ninhos encontram-se em árvores dessa espécie. Os outros 6%, minoria, naquela região, são encontrados em angico-branco (Pithecellobium edwallii).

 

Oco de árvore, local de postura dos ovos / Foto: Instituto Arara Azul.

 

A altura de construção do ninho varia conforme a altura da árvore. Já foram observados ninhos ativos a pouco mais de 2 metros de altura a até quase 15 metros. 

Para a nidificação, estas aves se aproveitam de pequenas cavidades feitas por cupins, formigas, pica-paus, bactérias, fungos ou quando os galhos se quebram. A partir da pequena “falha” na madeira, com seus bicos fortes, elas abrem um espaço maior para criar seu ninho. Em seguida, utilizam a serragem que tiram da própria árvore, para forrar a base. Ao transformar uma pequena cavidade em um grande ninho, elas são conhecidas como engenheiras ambientais

 

Foto: Cézar Côrrea.

 

Além de fiéis aos parceiros, elas também são fiéis aos seus sítios de reprodução, tendendo a voltar nas próximas temporadas reprodutivas. Mas sempre, reformando o espaço. Quem não gosta de uma casa bem arrumada?

Apesar de serem devotas aos ninhos, eles não são individuais, podendo ser utilizados por outros indivíduos e até mesmo, por outras espécies que competem pelo espaço. O que realça a importância do manduvi para a fauna no geral. 

Além da preferência por uma certa espécie de árvore, esses psitacídeos também preferem áreas mais abertas, de pequenos capões com acuris (Attalea phalerata) ou borda de cordilheiras, onde escolhem árvores de grande porte. O que facilita a sua alimentação seja pelos acuris ou pelos cocos que são frequentes em campos, a acessibilidade a essas árvores, visto o tamanho das araras e a visibilidade para se proteger de distúrbios.

 

União e cooperação entre o casal 

Divisão de tarefas é a chave do sucesso para uma relação duradoura, não é mesmo? Junto à construção do ninho, inicia-se a cópula. E junto à postura dos ovos, inicia-se a clara divisão de trabalho entre o casal. A fêmea normalmente ovipõe dois ovos (número que varia de um a três), que são incubados de 28 a 30 dias pela mãe. Enquanto isso, o macho fica responsável por vigiar o ninho, vocalizando quando há algum perigo, e alimentar sua parceira, buscando alimento de 4 a 6 vezes por dia. Ao alertar a fêmea de uma possível ameaça, ela sai do ninho, e juntos, o casal vocaliza espantando o perigo. 

 

Foto: Fernanda Fontoura.

 

Nesse período, principalmente no momento de divisão de alimentação, é possível ver comportamentos de limpeza de penas, chamado de alopreening entre o casal e também, cópulas (conheça outros comportamentos das araras-azuis aqui). 

 

Alopreening. Foto: João Marcos Rosa.

 

Uma curiosidade é que mesmo quando há grandes perturbações humanas, as araras-azuis não abandonam seus ninhos, se mantendo fiéis à eles

Até dois dias após o nascimento dos filhotes, o macho continua na tarefa de prover alimentação à fêmea e proteção ao ninho. 

Com uma taxa de eclosão de 90%, as araras-azuis nascem bem pequenas, em média com 82,7mm e 31,6g e passam a receber alimento no segundo dia de vida.

Com o nascimento, a fêmea começa a sair em busca de comida e então ambos os pais realizam a tarefa de alimentar suas crias. À medida que elas crescem, os pais passam menos tempo no ninho, mas sempre dando todo o suporte necessário à prole. 

 

Foto: Fernanda Fontoura.

 

Com cerca de três meses, as atividades de vigiar o ninho e cuidar dos filhotes começam a ser feitas em rodízio pelo casal. Nessa fase também é iniciado o treinamento de voo – com 107 dias de vida em média e cerca de 1,2kg, as araras voam pela primeira vez.

 

Foto: Kefany Ramalho.

 

Após sua saída do ninho, há um longo processo pela frente. Agora elas precisam aprimorar o voo, aprender a se alimentar, descobrir onde dormir e como se defender. Feito um longo treinamento, com cerca de 1 ano e 4 meses, as jovens araras se tornam independentes dos pais. 

 

Fatores que afetam a reprodução

 

Foto: A. Cecília.

 

Sabe-se que a taxa reprodutiva dessa espécie é baixa e vários fatores podem afetar o sucesso de sua reprodução. O principal fator é que a espécie não se reproduz todos os anos, novas cópulas só ocorrem após o cuidado com seus filhotes chegar ao fim, o que leva pouco mais de 1 ano. 

Outro motivo relevante é a quantidade de cavidades disponíveis: o número de manduvis, árvore preferida pela espécie, vem diminuindo, seja por sua degradação natural, incêndios ou desmatamento. 

 

Área queimada. Foto: A. Cecília.

 

O desmatamento promove não só a redução da quantidade de árvores de manduvis, como a redução de árvores de diâmetro adequado para formação de ninhos no Pantanal. Soma-se a isso a competição: de 8 a 19% dos ninhos ativos das araras-azuis são ocupados por outras espécies

A predação também é um outro obstáculo que afeta o sucesso reprodutivo, tanto os ovos quantos os filhotes são predados por diversos animais. A taxa de predação dos ovos varia de 20 a 40%, sendo os quatis, gambás, tucanos, gralhas e gaviões alguns dos predadores. Já os filhotes de até 45 dias de vida, podem ser predados por tucanos, gaviões e até mesmo formigas.

Além disso, em ninhos com dois filhotes, quando a diferença de tempo entre os nascimentos é superior a quatro dias, normalmente o segundo filhote vem a óbito. Isso porque o caçula tem dificuldade em disputar o alimento com o irmão, sofrendo com desidratação e perda de peso severa.

 

Dois filhotes com 90 e 93 dias de vida. Foto: Lucas Rocha.

 

Fatores que realçam a importância dos estudos sobre a espécie, estudos que nos permitem conhecê-las cada vez mais, entendendo melhor todas essas ameaças enfrentadas por elas e assim podermos trabalhar para o aumento do seu sucesso reprodutivo. Todos esses fatores realçam a importância do nosso Projeto Arara-Azul, que vem sendo realizado desde 1990. 

 

Atuação – Projeto Arara-Azul

Entre as várias frentes do projeto, atuamos em um dos principais desafios reprodutivos das araras-azuis: o baixo número de cavidades disponíveis para nidificação. Já são mais de 880 ninhos cadastrados e monitorados, 400 deles, artificiais, colocados por nossa equipe. 

 

Casal no ninho artificial.  Foto: João Marcos Rosa.

 

Os ninhos artificiais também têm sido efetivos: ao avaliar os ninhos no Pantanal de Miranda, nos anos de 2011 e 2012, foi visto que embora o potencial reprodutivo tenha sido maior nos ninhos naturais, a taxa de reprodução e sucesso reprodutivo foi maior nos ninhos artificiais. 

 

Foto: Cezar Corrêa.

 

Desde o início dos nossos trabalhos muitas informações comportamentais e reprodutivas foram coletadas. Sem falar na análise sanitária, genética e determinação do sexo dos filhotes, que também fornecem dados importantes para a conservação das araras-azuis.

 

Foto: Fernanda Fontoura.

 

Se você admira o nosso trabalho e tem vontade de contribuir para a continuidade de nossas ações, saiba como ajudar aqui.

E aí, deu para conhecer melhor a maternidade e a paternidade das araras-azuis? 

 

Texto por: Jéssica Amaral Lara

Revisado por: Juliana Cuoco Badari